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Casa de Chá da Boa Nova e Piscinas de Marés – Álvaro Siza

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19.01.2018
Gabriel Kogan faz uma análise de duas icônicas obras do premiado arquiteto português e reflete sobre a importância de conhecer e respeitar o entorno na hora de projetar.
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Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)

O arquiteto português Álvaro Siza ficou conhecido nas cidades onde trabalhou por entender profundamente as características sociais e naturais de cada lugar e, a partir disso, traçar precisas intervenções inseridas nessas realidades – como se cada obra fosse parte do entorno e como se fosse impossível imaginar novamente aqueles espaços sem essas construções.

A frase “o projeto partiu de uma análise criteriosa do lugar e das necessidades…”, hoje vastamente usada por arquitetos e estudantes de todo o mundo no início de qualquer descrição arquitetônica, não seria tão popular sem as obras de Siza e suas preocupações com o contexto. Para ele, o contextualismo não é uma mera escolha projetual, mas sim uma posição ética do arquiteto perante o mundo.

Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)

Quando, em começo de carreira, com apenas 25 anos, Siza projetou a Casa de Chá da Boa Nova em Matosinhos (1958-63), sua preocupação principal era não ofuscar a igreja histórica existente e a impressionante paisagem da costa de Leça da Palmeira com a sua nova obra.

Sobre o temor que sentia nesses seus primeiros passos profissionais, o próprio arquiteto escreveu, mais tarde, em seu livro-relato Imaginar a evidência (2000): “Como mostram, sobretudo, algumas experiências recentes, muitas vezes construir num local muito belo equivale a destruí-lo”.

Para tanto, Siza adota então o critério de manter a nova construção mais baixa que o monumento histórico e de sobrelevar delicadamente o costão rochoso do litoral português, transformando-o em uma cobertura inclinada feita com tradicionais telhas de barro, mimetizada com a paisagem.

Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)
Casa de Chá da Boa Nova (Foto: Fernando Guerra)

A angulação do telhado se assemelha ao terreno existente, em declive, e a aconchegante atmosfera interna preenche o vazio criado entre o solo e a cobertura. O projeto assenta os novos volumes no terreno, como as pedras – por lá bem antes de qualquer intervenção humana.

O diálogo com o entorno pautou a escolha dos materiais: o concreto – que emerge da fundação – se mimetiza com as pedras do local; o vidro recria o vazio e, consequentemente, acentua a fluidez entre o interior e a paisagem; as paredes brancas caiadas remetem às construções portuguesas tradicionais, incluindo a igreja próxima. Coube à madeira da estrutura, aos caixilhos e ao forro formular o contraste do ambiente interno acolhedor com o entorno, quase inabitável, agressivo, do costão e das ondas.

A obra, que passou anos em péssimo estado de conservação, em ruínas, hoje não abriga mais uma casa de chá, mas sim um estrelado restaurante.

Localizado a poucos metros dali e feito logo após a empreitada da Casa de Chá, o projeto de Siza para as Piscinas de Marés (1961-66) se contrapunha à ideia anteriormente sugerida pelo engenheiro Bernardo Ferrão para o mesmo lugar.

Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)

Em vez de uma pesada piscina delimitada por quatro paredes de concreto sobrepostas às pedras defronte para o mar – como era o projeto anterior, que ignorava totalmente a paisagem do entorno –, o arquiteto procuraria na geometria da própria natureza as formas dos muros, delicados e baixos, que delimitariam a piscina de água salgada a partir das pré-existências locais.

Siza descreveria essa tarefa como a própria essência da arquitetura: “Uma arquitetura de grandes linhas, de paredes compridas, buscava um encontro com os rochedos no lugar adequado. O objetivo consistia delinear, naquela imagem orgânica, uma geometria: descobrir aquilo que estava disponível e pronto para receber a geometricidade. Arquitetura é geometrizar”.

Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)

Esse profundo respeito às situações e aos lugares seguiu-se nas décadas seguintes, quando Siza passou a ser comissionado para projetar em ambientes populosos e urbanos significativos projetos públicos, como as habitações sociais de Porto, Haia, Berlim e Veneza.

No decorrer de sua produção, o contextualismo estabelecido com a natureza adquiriria, assim, uma dimensão sociológica, fazendo com que sua arquitetura firmasse fortes vínculos não só com o entorno de cada obra, mas também, com os moradores de cada lugar e suas necessidades.

Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
Piscinas de Marés (Foto: Fernando Guerra)
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Gabriel Kogan
Colunista
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Arquiteto e crítico, formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de...

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