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Time que participou da caminhada (Foto: José Valério dos Santos Neto)

A arquitetura como transformação social

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Ensaio de fotografia durante a atividade Projeto Cor em Ação + Caminhada Jane Jacobs Floripa expõe o incontestável: pequenos e potentes gestos de acupunturas urbanas que transformam vidas.
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A arquitetura interfere nas formas de organização da sociedade, mas também é modificada pelo comportamento social.  É uma ferramenta potente de transformação social, com impacto direto na percepção dos espaços públicos e comunitários. Gera pertencimento e autoestima em projetos com a participação da comunidade. São muitos os exemplos de ações realizadas em diferentes territórios e escalas que têm a iniciativa de qualificar os espaços públicos. O Projeto Cor em Ação, que acontece na Serrinha, em Florianópolis, é um desses exemplos que abordamos no texto e no ensaio fotográfico realizado pelo arquiteto e fotógrafo José Valério Santos Nunes, e que expõe o óbvio: pequenos e potentes gestos de acupunturas urbanas que transformam vidas.

Ensaio do fotográfico do arquiteto e fotógrafo José Valério dos Santos Neto

“As melhorias do espaço público e a requalificação urbana são ações transformadoras que estão acontecendo na Serrinha”, diz o arquiteto Gustavo Andrade, arquiteto, urbanista e pesquisador do Laboratório Cidade e Sociedade da UFSC e coordenador do coletivo ativista Caminhada Jane Jacobs Floripa. Ele foi convidado para a realização da última ação de 2020 chamada Projeto Cor em Ação + Caminhada Jane Jacobs Floripa, cuja intenção foi apresentar, numa live ao vivo no instagram do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Santa Catarina (CAU/SC), o resultado do projeto contemplado com o edital “Acupunturas Urbanas”. “A gente aproveita a caminhada para discutir temas da cidade, um pouco de atenção aos espaços precários promove um ganho de qualidade muito grande”, afirma.

Depoimento do presidente da Associação de Moradores da Serrinha para jornalista Simone Bobsin, voluntária do projeto (Foto José Valério dos Santos Neto)
Membro da Associação de Moradores, Batoré (Foto: José Valério dos Santos Neto)
Arquiteto Jordi Sanchez-Cuenca, coordenador do projeto (Foto: José Valério dos Santos Neto)

Além de mostrar as intervenções realizadas com a comunidade, as caminhadas são oportunidades para a reflexão sobre o Direito à Cidade, um conceito que surgiu nos anos de 1960 criado pelo sociólogo Henri Lefebvre, que defendia a não exclusão da sociedade urbana das qualidades e benefícios da vida na cidade. Esses direitos são dispositivos que fazem uma parcela da população se mobilizar em busca de transformações em seu contexto. O Projeto Social Cor em Ação exemplifica esse desejo de agir coletivamente.

Projeto Cor em Ação

O projeto se dá na esfera pública a partir da requalificação das vielas, melhorando as condições de acessibilidade. São realizadas obras como degraus, rampas, corrimão, reparos e pintura que transformam a relação dos moradores com a rua e o bairro. O pouco que é feito é o mínimo necessário e é gigante para quem vive naquele território. Foram contempladas a Rua do Paulo numa primeira fase, e as Ruas da Paz e da Sol na segunda etapa, que contou com o patrocínio do CAU/SC, doações e financiamento coletivo.

 Rua do Paulo, na Serrinha, onde aconteceu a primeira etapa do Projeto Cor em Ação (Foto: Divulgação)

“O protagonismo dos moradores é fundamental para resolver problemas reais e não o que os técnicos acham que devem melhorar”, afirma o arquiteto Jordi Sanchez-Cuenca coordenador do Projeto Cor em Ação. Ele é formado em Barcelona, mestre pela Bartlett de Londres, doutor pela UFSC, e especialista em habitação social, saneamento e reabilitação de bairros precários. A obra na rua do Paulo foi realizada por meio de mutirão com a comunidade. Já nas ruas da Paz e da Sol, foi contratada mão de obra para a execução dos degraus e rampas e ações de mutirão comunitário para pintar as fachadas e os degraus, reforçando, sempre, a importância da participação para criar senso de pertencimento.  

Oficina com as crianças

Para além das intervenções, o Projeto Cor em Ação também planeja atividades que fomentem a educação. Por isso, foi realizada a Oficina de Desenho Criativo e um concurso de cartazes sobre o lixo com as crianças da comunidade, com o apoio da Casa São José. A ideia foi promover conceitos de cidadania e a reflexão sobre o lixo no contexto do bairro e da cidade. Os desenhos foram expostos de forma on-line na rede social do projeto e foi realizada a instalação de lambes-lambes em pontos estratégicos da Serrinha. 

Caminhada na Serrinha (Foto: José Valério dos Santos Neto)

Como tudo começou

Ano de 2017, quando tudo começou. O primeiro movimento deu-se a partir da angústia e da inquietação da Christiane, Claudia, Daniela, Silvana, Ivania e Aline em relação às dificuldades de mães da Serrinha que viviam de forma extremamente precária. Chamado de Projeto Serrinha, o apoio se dava por meio de brechós na comunidade, financiamento colaborativo, doações e mobilização de voluntários para ajudar as famílias na reforma e construção de suas casas. Desta maneira o projeto ajudou as famílias da Antonia, da Ana Maria, Analice e Ciane a terem uma moradia digna. Os arquitetos Antônio Couto Nunes, Vinicius Mariot e Guilherme Cascaes foram colaboradores do projeto, planejando a ampliação de uma das casas.

Neste contexto de pobreza, a Associação de Moradores viu uma possibilidade de expandir as ações para o espaço público e solicitaram à Igreja Luterana da Trindade (CELT), que já estava engajada no processo, que apoiasse a comunidade na melhoria de algumas vielas do bairro. A partir deste momento surgiu o Projeto Cor em Ação cuja primeira fase foi a melhoria na Rua do Paulo, em 2019, com finalização das obras em julho de 2020.

O projeto é uma realização da Comunidade Evangélica Luterana da Trindade (CELT), que atua de forma voluntária e tem o apoio da Associação de Moradores da Serrinha, da Casa São José e de inúmeros voluntários, além dos arquitetos Elisa Lacerda e Jordi Sanchez-Cuenca e a Udesc em Ação.

Maciço Central de Florianópolis 

A Serrinha faz parte Maciço Central de Florianópolis, o Morro da Cruz, no centro da cidade, um conjunto de 16 bairros com altos índices de pobreza e precariedade. Surge como parte do desenvolvimento iniciados pela instalação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) no Pantanal e Trindade, o que gerou um forte crescimento urbano numa zona que, até então, era praticamente rural.

O que é a Caminhada Jane Jacobs

Nos EUA, na década de 1960, surgiu um grupo que defendia a participação ativa da população na cidade tendo como personagem central a ativista Jane Jacobs. Ela defendia que a população devia ser perguntada quando fosse afetada por qualquer obra de infraestrutura. Inspirado em outras ações pelo mundo, o arquiteto Gustavo Andrade junto com um grupo de amigos criou a Caminhada Jane Jacobs Floripa, que propõe caminhar pela cidade refletindo sobre temas diversos, na maioria das vezes baseados na relação do pedestre com a cidade.

Jane Jacobs era jornalista, foi urbanista e ativista social norte-americana que mudou a visão sobre como devemos analisar os fenômenos urbanos. Ela ficou conhecida por seu livro “Morte e vida das grandes cidades”, de 1961. Para ela, e nada mais atual, o cidadão não deve ser entendido apenas como consumidor passivo de um projeto de cidade imposto. Ele precisa e deve ser ouvido.

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Foto de destaque: Time que participou da caminhada: arquitetos Gustavo Andrade, Jordi Sanchez-Cuenca, Antônio Couto Nunes e José Valério dos Santos Neto e a jornalista Simone Bobsin

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Simone Bobsin
Colunista
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Jornalista com atuação no segmento de arquitetura e design há mais de duas décadas....

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